quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

Deixa a chuva me levar

Zeca Pagodinho, intérprete consagrado, conta bancária sem problemas. Morador autêntico de Xerém (a ponto de ter voltado da Barra da Tijuca depois de morar lá por pouco tempo), seu sítio não foi afetado pelas fortes chuvas de hoje. Ainda assim, ele mostrou o que é ser uma estrela de verdade.

Zeca não assinou um cheque para ajudar centenas de vítimas numa só canetada. Não fez campanha na TV, nem lobby com políticos. Tampouco tuitou sobre o que estava acontecendo ao seu redor sem sair do teto seguro. Zeca botou um casaco e saiu com seu quadriciclo, em meio à lama das ruas, para ajudar as pessoas que encontrava pelo caminho.

O flagra do momento foi registrado pela Globonews (vídeo abaixo), e Zeca traduz com seu rosto tudo o que as imagens e os textos repetitivos não conseguem descrever. A entrevista acaba quando o repórter da vez manda a pérola de sempre: "Qual o seu sentimento?". O sambista engole as palavras devidas e parte pra fazer o mais importante.
 
Um exemplo pra todos nós, e também para as celebridades "engajadas" ou oportunistas que vêem na responsabilidade social uma boa pitada de marketing. Mas deixo eles pra lá. Zeca foi um exemplo pra mim, e ainda tocou em questões étnico-bíblicas.
 
A párabola do bom samaritano mostra um judeu recém-vilipendiado por assaltantes sendo ajudado por um grande inimigo, depois de desprezado por várias pessoas. Não se enganem: os samaritanos também odiavam os judeus.  Contando essa história Jesus desarmava ambos os povos e respondia que o mais importante era o amor, encarnado em ações. E ele usou essa parábola para responder à seguinte pergunta: "Quem é o meu próximo?".

Assim, o meu próximo sempre vai ser alguém que precisa de mim, e já. E esse ato nos iguala, morrendo qualquer diferença que impeça que o próximo fique distante e carente do que necessita com urgência. O abastado Zeca Pagodinho saiu de seu sítio, usou seu veículo, pisou na desgraça, acolheu os necessitados.

Zeca não teorizou, não teologizou, não se justificou, não achou melhor liderar um movimento antes de agir. Viu o que podia fazer, e fez. Esteve presente, junto às pessoas, humanizando a solidariedade via calor humano e próximo.

Quem é o meu próximo "da vez"? Mesmo fora dos períodos de chuva, sempre haverá um. Mesmo que eu não resolva todos os problemas sociais, ou dê um jeito na vida do assistido. Ainda assim, vai contar. Vai fazer diferença na vida daquela pessoa.

Não quero que a "ordem pública" ganhe do espírito solidário. Não aceito ficar cauterizado quando puder me mexer pra ajudar alguém. Zeca Pagodinho mostrou que não é preciso muito. E mostrou muito. Muito bem. Deixo a vida me levar pra essas bandas, sendo feliz e agradecendo e por tudo o que Deus me deu - e me libera pra compartilhar.
 
(Foto: Cléber Júnior / Agência O Globo)


Um comentário:

Marcos André Lessa disse...

Pois é, Ricardinho, e eu ainda fiquei pasmo quando descobri q esses valentões do Twitter estavam acusando o Zeca de ser oportunista...