quarta-feira, 23 de junho de 2004

A maior responsa!

Tenho 23 anos, mas acho que não é nada cativante a campanha para incentivar o voto aos 16 anos. Aliás, lanço a dúvida: por que podemos votar aos 16 mas não dirigir? Qual é a maior responsabilidade: decidir sobre os rumos de um carro ou de um país? (Lembro também que o voto após 65 anos também não é obrigatório. Porém é mais difícil fazer a cabeça de quem tem uma vida de experiências nas costas, né?)

"Fazer a cabeça" parece ser a expressão cabível. Não se explica a importância de se votar aos 16 anos, apenas larga-se o imperativo: vote aos 16! Começa aí a cultura de que o voto é um instrumento como outro qualquer, quando não é verdade. É único e incomparável, sempre subestimado na medida das conveniências dos que prosseguem em seus coronelismos adaptados Brasil afora.

Apenas vote! Por quê? Por que o voto é um instrumento de cidadania? Não se explica. Nem o fato de que o voto é muito mais uma conseqüência do processo político do que o início dele. O voto materializa nossas concepções e maturidades, é resultante do trato que queremos dar ao futuro da nação. Vote aos 16, dirija aos 18. O voto é o volante.

O arrependimento de cada eleitor é lícito, mas a teimosia alienada - que "esquece" os desvios de conduta dos representantes, que vê a corrupção com certa simpatia pela malandragem brasileira - é imperdoável e inconseqüente. Por isso fica muito fácil falar que são "os políticos", a "elite dominante" que não tira o país das constantes crises de confiança. Ali, em cada parlamento, está representada a sociedade brasileira. Cada comportamento e benefício adiquirido, cada personagem folclórico que abusa dos cofres públicos e arranca, no máximo, um sorriso de desdém irresponsável. Estamos todos ali. Merecemos esse sadomasoquismo.

Ou não? Ou é hora de pensarmos no voto não apenas a caminho da zona eleitoral, mas desde sempre? Deixando de lado os determinismos que enquadram a política no campo do imponderável e do incorrigível, portanto façam o que quiser com ela. Os desvios de dinheiro são dos nossos impostos! Quanto mais desvios, menos dinheiro no caixa, impostos mais altos! Quanto mais condutas folclóricas de terça a quinta na isolada Brasília, é um passo a menos na universidade pública e gratuita, nas tarifas mais baixas. O sistema público de saúde já foi pro espaço e morda-se você com a mordida do plano de saúde.

Ah, nossos 16 anos podem ser bem mais interessantes...

quinta-feira, 3 de junho de 2004

A ambigüidade a ser resolvida

Nesses tempos de grande desenvolvimento das mídias, é preciso saber usá-las. Assim, nesse verbo, é que pensam muitos políticos de hoje, e alguns têm se tornado especialistas no assunto. Retiram-se dos holofotes quando necessário, reaparecem quando convém, e o tal do jornalismo redundantemente investigativo sendo jogado de um lado pra outro, quase cadavérico.

Exemplo: no último domingo o "Canal Livre", programa que encerra a programação
da TV Bandeirantes, é um "Roda Viva" menor, com três jornalistas experientes entrevistando uma personagem política brasileira. Passando os canais vi que o ex-tudo Paulo Maluf era a bola da vez. Não assisti à entrevista, mas ao acessar o Yahoo.com.br no dia seguinte, lá estava a chamada: "Maluf promete acabar com taxas da luz e do lixo".

Bom, e daí? Daí que uma rica palavrinha não pode ser ignorada nunca: contexto.

Maluf passa pela milionésima acusação de desvio de dinheiro público, a despeito de suas incríveis reeleições. Dessa vez, 300 milhões de dólares surgiram na conta que leva sua assinatura nas Ilhas Cayman e, claro, o ex-tudo diz que não é dele. Mais: diz que alguém colocou essa quantia lá para prejudicá-lo. Não deixa de ser engraçado, mas pergunto: quem, só de sacanagem, colocaria tanta grana na conta de alguém só pra "sujar o nome" da pessoa? Nem o partido de Maluf acredita na sua versão, a ponto de o lançamento de sua candidatura a prefeito de São Paulo ser marcada pelo constrangimento geral dos próprios correligionários.

Pois bem, Maluf é candidato em meio ao pior processo acusatório de sua carreira política (pior no sentido de ser mais difícil de sair dessa e sem culpa). Nesse momento, é a principal atração do "Canal Livre", por duas horas, cercado por jornalistas como Carlos Nascimento e Fernando Mitre.
No dia seguinte, o Yahoo destaca duas promessas de campanha que com certeza farão que o ex-tudo ganhe pontos com os adversários de "Martaxa" Suplicy, como foi apelidada.

Logo, o programa jornalístico da Band transformou-se em palanque privilegiado para um réu quase condenado. E um dos sites mais populares da rede destaca suas propostas para a eleição. No caso do Yahoo, acabou seguindo a lógica da internet de criar uma chamada que atraia o leitor para o resto do texto. Mas pinçou da entrevista de Maluf o que ele com certeza gostou de ser pinçado: suas boas notícias.

Será que a Band pensou apenas nos eleitores de Maluf pra garantir a audiência do programa? Porque acabou sujeitando os experientes jornalistas a emprestar sua credibilidade ao candidato mais farto de acusações de corrupção. Maluf "auto-convidou-se"? Não se sabe. Mas saiu ganhando.

A função de fiscalizar o poder está sendo negligenciada por boa parte da imprensa, que tem se entregado cada vez mais a arroubos passionais pra guiar sua cobertura. Algumas doses de álcool ou as besteiradas das colunas de notinhas importam mais que a maior cidade do país ser governada por um campeão da sujeira política? Imparcialidade não existe, mas responsabilidade sim. De qual dos dois está tentando fugir a mídia brasileira? E quem a está botando pra correr?