domingo, 29 de fevereiro de 2004

Da decepção

Déjà vu surge a torto e a direito, a ponto de já presenciarmos o déjà vu do déjà vu. Com a política brasileira, tal fenômeno voltou a voltar a ocorrer nas últimas semanas. A tal "pureza ética" do PT, por mais que essa expressão soe idílica demais, era uma impressão real. Ou não daria tanto barulho ao ser arranhada. Mesmo contrariados, opositores eram obrigados a aceitar isso, tendo em vista a escassez de estatísticas de corrupção nos quadros do Partido dos Trabalhadores.

Todavia, não é que eles também tinham o seu PC?

Se Dirceu estava envolvido ou não, se sabia ou não, se o Governo foi conivente ou não... Tudo isso se resume às disputas de cargos em Brasília, essa ilha em alta terra, tão distante da população quanto à época da Independência. O turbilhão no centro do poder, usando uma expressão de Aristides Lobo, está sendo assistido por um povo "bestializado", meramente espectador dos acontecimentos. Ou não?

Por isso, transponho as notícias do Planalto a uma realidade superior aos joguinhos de poder tão comuns ao ser humano. Como fica nossa cidadania perante tudo isso?

Uma vez que o PT representava, no imaginário coletivo, o último "bastião ético da política" (bonito esse jargão, né? Mais uma pérola da repetitiva imprensa brasileira), que motivação para seguir acreditando? Que estímulo, que incentivo à participação política por meio do voto, uma vez que a corrupção parece ser o grande proprietário dos destinos da nação, desde 1500?

Só essa questão me interessa. O resto é em Brasília, esse distante país, essa tragédia que JK ajudou a construir. Ah, como diz Herbert Vianna, se essa palhaçada fosse na Cinelândia, ia ter muita gente pra juntar na saída, pra fazer justiça uma vez na vida.

Brasília é a concretização de um sonho comum aos íntegros e aos corruptos. A materialização da plenitude da arquitetura e do ideal de progresso; a marcação cerrada de uma distância do povo, esse ser amorfo e invocado a cada 4 anos ou a pretexto demagógico. Mas que, tendo oportunidade, faz valer o seu direito.

É fazendo parte desse ser amorfo que prossigo querendo fazer valer o meu direito. E o meu dever. O meu direito de votar e o meu dever de acompanhar; o meu direito de escolher e o meu dever de reprovar, deixando de votar em quem esqueceu que foi votado um dia. Defendo meu direito de saber do que acontece com meu dinheiro tornado público, e meu dever de prestar minhas contas sem sonegação. Afinal, boa parte dos escândalos que nos enojam nada mais são que pequenos escandalozinhos do cotidiano em escala maior.

A corrupção endêmica brasileira é o pretenso cidadão pego em flagra na sua hipocrisia. É nessas horas que confirmamos nosso sistema político: democrático REPRESENTATIVO, do bom e do pior. A coerência começa em nós, em nossos círculos pessoais, em nossos alcances devidos. Não precisamos de partidos para projetar o que deveríamos ser e não temos coragem.

Diante disso, repensemos o nosso conceito de decepção perante a canalhice da vez.

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2004

Prazer, obrigação, suspiros

Ao passar no vestibular, nos idos de 2000, ouvi a sapiência de um amigo entrado em dias: "Na faculdade temos duas grandes alegrias: quando passamos e quando nos formamos". Preciosas e proféticas palavras. Em meu período pré-calourano, tal afirmação me escandalizava! Hoje, constato ser verdade. Mas por que isso se dá?

Não é apenas pelo fato de estarmos terminando uma etapa de nossa vida. É preciso falar de uma realidade que qualquer graduando com real interesse na qualidade de sua formação se depara: o que poderia ser um aprendizado prazeiroso, muitas vezes transmuta-se em penosas obrigações.

De novo: por que isso se dá? Pode ser pelo professor, pela expectativa que colocamos em determinadas matérias, pelos mitos da profissão que vão caindo pelo caminho... Mas, tratando-se de ensino e de sua apreensão, perdoem-me os docentes, o mestre tem uma extrema dose de responsabilidade quanto ao resultado em forma de decepção.

Como em qualquer ambiente educacional, os alunos estão subjugados ao professor, desde o conteúdo a ser transmitido até as práticas de aula. E não são poucos os casos em que esperamos muito de uma matéria ao ver sua ementa e o dia-a-dia de seu desenvolvimento ser um desejo de que tudo acabe o mais rápido possível. 8 ou 80: se um extremo compõe-se de professores desleixados que adoram uma única avaliação final pra ninguém ser reprovado e ele dar a aula que quiser; outro é a existência de mestres que fazem da aula uma seqüência de pontos a bater, a cada semana um seminário complexo a ser apresentado, um denso trabalho de grupo, testes que parecem querer provar que você nunca saberá nada do que pensa estar aprendendo.

Caros leitores, nào prego aqui a vagabundagem sem peso na consciência. Mas chamo a atenção para o potencial que o professor tem de destruir a sede de saber que necessitamos até o fim dos dias. E logo no pior ambiente para isso: a escola ou a universidade. Se ainda fosse em seu exemplo de vida, isso seria uma questão mais complexa e fora do âmbito da aula. Mas se no ofício para o qual se preparou para exercer ele extermina o foco da sua profissão, ficamos desolados.

A outra face é verdadeira: professores que marcaram nossa vida (positivamente) foram os que encarnaram o bom senso em sua multiplicidade: amizade, cobranças, notas justas e aulas idem, desejo de promoção social discente - não de terrorismo com o mínimo de autoridade. Ou de ofensiva indiferença perante os que dele dependem para aprender.

Portanto, façam valer o 15 de outubro. Não negligenciem a a árdua mas recompensadora tarefa - para uma geração inteira - à qual foram predestinados. Sei que haverá motivos que desmotivam no decorrer da carreira. Porém, outros de igual forma buscam atenuar a contrapartida dos alunos. Estamos no mesmo barco e acreditem, todos queremos ser bem-sucedidos como Noé.

domingo, 8 de fevereiro de 2004

Voltei, voltei...

As desculpas não eram muitas, sequer inventadas. Mas, de fato, faz tempo que não escrevo por aqui. Porém acabei me inspirando em meu último post pra tornar esse blog atualizado de maneira mais constante.

Como assim?, você pergunta. Ninguém sabe, mas escrevi o poeminha abaixo no meu trabalho. Sou bancário - ou melhor, ESTOU bancário - e de 8 às 10 da manhã dou meu plantãozinho no hall com máquinas de saque. É isso mesmo, ajudando milhões de velhinhos diariamente, traduzindo para a língua terráquea o que diz ali no extrato... E num dia de pouco movimento, rabisquei num canto da prancheta o meu Anseio. Referia-se a minha situação profissional atual.

Mas por que ele me inspirou?, você pergunta de novo. Porque não fiquei esperando a melhor situação pra escrevê-lo, pra desabafar nas letras, pra desenvolver meu talentozinho. E o Lessog estava sofrendo disso: procrastinação. Em português javélico, empurrar com a barriga. Tive suspeita de tendinite, a tão conhecida falta de tempo, o fantasma do ter-que-estudar. E nada de blog atualizado.

Também havia meu pensamento metido a organizadinho que havia baixado uma lei invisível no Lessog: apenas artigos opinativos sobre fatos conhecidos, divulgados na mídia em geral. Tom pessoal? Nããão! Isso todo blog tem. Aqui é o lugar pra originalidade! (Não sei se um blog desatualizado é tão original assim...)

Posto isso, saibam meus queridos leitores (sim, existem, a caixa de comentários é a certidão de nascimento deles!) que escreverei aqui quando der na telha. Dizem que se você não bota pra fora sua raiva pode vir a ter câncer. Se eu não escrever quando a inspiração me seqüestrar, ficarei claustrofóbico no cativeiro. Logo, os temas vão variar mais. Hoje, por exemplo, escrevo sobre voltar a escrever. Uma metalinguagem não faz mal a ninguém...

Mas estou de volta! O tom pessoal, o quase-diário vem dividir espaço com minha verve jornalística e opinativa sobre tudo e todos. Peço que o habitante por trás das janelas de sua alma se aprochegue e não se apoquente. Não haverá arrependimento por tascar as pupilas no Lessog. E fique atento, porque daqui a um tempinho (sem força de expressão) tem post novo. E tenho escrito.