Por trás das lentes dos meus óculos
Por trás das lentes dos meus óculos existe alguém ambicioso. Alguém que busca, minuto a minuto, algo que não há como saber se é cobiçado pela maioria dos seres humanos. Se é, tal procura não parece ser assumida publicamente. Uma ambição, como já disse, e não há outra maneira de descrever a perseguição desse objetivo, cujo caminho é cheio de armadilhas e auto-empecilhos. Por trás das lentes dos meus óculos existe alguém que não quer outra coisa que não a simplicidade.
É a rotina de acordar, lavar o rosto, tomar o banho que desperta, portar os óculos e me postar para a retomada diária da busca. É reassumir sem desespero as complexidades que nossa vida nos reserva, sabendo que isso faz parte da motivação para a busca. É ter sede de conhecimento, na vazão da leitura plural e sem preconceitos, nos contatos assimilados e mantidos, empreendendo os cinco sentidos no espocar das mídias e de suas informações.
Ao mesmo tempo, é sentir dor. Por mais que eu me esmere em buscar a simplicidade em todos os meus atos e palavras, construindo comunhão com quem está ao meu redor, sem ares de superioridade, ainda assim posso ser classificado como "superior". Ou intelectual, ou coisa parecida. E esse é um momento de angústia. De sentir na pele, na boca e na mente o gosto de distância, de ainda estar longe da tal simplicidade, uma vez que ainda sou assim classificado. De me sentir segregado enquanto remo com toda força contra essa maré.
E ao flagrar aqueles que pouco se importam em serem assim classificados, ou melhor, que se esbaldam em serem "especiais" e a quilômetros dos "seres humanos comuns", mantendo as barreiras que eu tento transpor - os "auto-empecilhos" - me vem a sensação de abandono. Abandonado entre os que sentem prazer em ser "elite", ao não comungar dos seus paladares; e abandonado por aqueles a quem tento me ladear no contato pessoal com a simplicidade, e que no entanto não detectam essa minha vontade, essa minha busca. Sinto-me só e incompreendido.
Por trás das lentes dos meus óculos existe alguém assim. E se existe alguém assim à frente das lentes dos meus óculos, que um dia a mim se manifeste. Vai ser um alívio renovador. Para ambos.
terça-feira, 24 de janeiro de 2006
terça-feira, 10 de janeiro de 2006
Não!
Quem sabe dizer não? Você sabe? Eu sei? Não sei não. E por que não? Como saber? Apenas três letras, sempre imperiosas e imperativas por si só, por que não? Qual é a dificuldade? Por que tanto vício no aceite, no concordar sem questionar, no "engolir" e só depois perceber que desde o início a resposta devia ser "não"? E agora agüentar as conseqüências, nesse sentimento de vergonha secreta, em que só nós e o espelho nos torturamos mutuamente enquanto os beneficiados por nossa covardia se deleitam?
A comunidade do Orkut "Preciso aprender a dizer NÃO!" já conta com quase 80 mil pessoas! Nada comparado a 6 bilhões de habitantes do planeta. Ainda assim, 80 mil seres como eu que ainda não aprenderam a dizer a palavrinha em tantas situações, para o nosso próprio bem. Eu me pergunto: por que, tendo consciência desse problema, ainda é tão difícil dizer NÃO?
Encontro um fiapo de resposta no shopping.
A opressão do consumo rodeia a nossa vida desde o nascimento. As roupas e lojas de bebês são variadas, e não me venha com o papo de que haver concorrência baixa os preços e ponto final. Pois as vendas e a publicidade deixaram de existir a fim de proporcionar a subsistência de uma vida digna do básico, para exortar com capa de profeta a opulência necessária (a quem?). Precisamos todos consumir, embora quase nunca precisemos consumir tanto. A ideologia do consumo além do necessário, como estilo e proposta de vida, tem levado muitos a suicídios de personalidade por meio do superficial.
Consumir é dizer sim. "Sim, vou levar"; "sim, eu compro"; "sim, eu aceito"; "sim, por que não?". Suspeito que temos tanta dificuldade em dizer não pela extrema lavagem cerebral, corporal e intelectual do consumo, que só existe a partir do nosso "sim". Sem sim não há compra nem venda. Logo, é preciso um pouco de "sim" para não morrermos pelo caminho. Mas viciar em "sim", fazendo da crítica uma herege em cleros capitalistas, é morte em vida.
"Ô garoto 'vermelhinho'! Aposto que não despreza uma Coca-Cola ou um tênis novo!". Estão certos. Não desprezo. Assim como não desprezo o equilíbrio. Dizer sim a todo instante é gangorra enterrada de um lado só, sem movimento nem diversão, tampouco qualidade de vida. E o drama para dizer não (mesmo tendo a consciência total de que é aquilo que preciso dizer naquele momento) é o sintoma dessa situação doente na qual me vejo inserido. Quem ambiciona continuar doente?
Preciso aprender a dizer não. Preciso dizer não. Sem grosseria, mas com firmeza. Sem estupidez, mas com coerência. Sem intolerância, mas com amor. Sim, eu preciso dizer não. Pra mim e por mim.
Enquanto produzia mais essas linhas, o maldito Word recém instalado me perguntava, a cada palavra digitada: "A Auto Correção não está instalada. Deseja instalar agora?". Para continuar a escrever, era preciso clicar infinitamente: não! Refestelo-me na ironia...
Quem sabe dizer não? Você sabe? Eu sei? Não sei não. E por que não? Como saber? Apenas três letras, sempre imperiosas e imperativas por si só, por que não? Qual é a dificuldade? Por que tanto vício no aceite, no concordar sem questionar, no "engolir" e só depois perceber que desde o início a resposta devia ser "não"? E agora agüentar as conseqüências, nesse sentimento de vergonha secreta, em que só nós e o espelho nos torturamos mutuamente enquanto os beneficiados por nossa covardia se deleitam?
A comunidade do Orkut "Preciso aprender a dizer NÃO!" já conta com quase 80 mil pessoas! Nada comparado a 6 bilhões de habitantes do planeta. Ainda assim, 80 mil seres como eu que ainda não aprenderam a dizer a palavrinha em tantas situações, para o nosso próprio bem. Eu me pergunto: por que, tendo consciência desse problema, ainda é tão difícil dizer NÃO?
Encontro um fiapo de resposta no shopping.
A opressão do consumo rodeia a nossa vida desde o nascimento. As roupas e lojas de bebês são variadas, e não me venha com o papo de que haver concorrência baixa os preços e ponto final. Pois as vendas e a publicidade deixaram de existir a fim de proporcionar a subsistência de uma vida digna do básico, para exortar com capa de profeta a opulência necessária (a quem?). Precisamos todos consumir, embora quase nunca precisemos consumir tanto. A ideologia do consumo além do necessário, como estilo e proposta de vida, tem levado muitos a suicídios de personalidade por meio do superficial.
Consumir é dizer sim. "Sim, vou levar"; "sim, eu compro"; "sim, eu aceito"; "sim, por que não?". Suspeito que temos tanta dificuldade em dizer não pela extrema lavagem cerebral, corporal e intelectual do consumo, que só existe a partir do nosso "sim". Sem sim não há compra nem venda. Logo, é preciso um pouco de "sim" para não morrermos pelo caminho. Mas viciar em "sim", fazendo da crítica uma herege em cleros capitalistas, é morte em vida.
"Ô garoto 'vermelhinho'! Aposto que não despreza uma Coca-Cola ou um tênis novo!". Estão certos. Não desprezo. Assim como não desprezo o equilíbrio. Dizer sim a todo instante é gangorra enterrada de um lado só, sem movimento nem diversão, tampouco qualidade de vida. E o drama para dizer não (mesmo tendo a consciência total de que é aquilo que preciso dizer naquele momento) é o sintoma dessa situação doente na qual me vejo inserido. Quem ambiciona continuar doente?
Preciso aprender a dizer não. Preciso dizer não. Sem grosseria, mas com firmeza. Sem estupidez, mas com coerência. Sem intolerância, mas com amor. Sim, eu preciso dizer não. Pra mim e por mim.
Enquanto produzia mais essas linhas, o maldito Word recém instalado me perguntava, a cada palavra digitada: "A Auto Correção não está instalada. Deseja instalar agora?". Para continuar a escrever, era preciso clicar infinitamente: não! Refestelo-me na ironia...
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