quinta-feira, 1 de julho de 2010

A PRAÇA

Hoje moro em frente a uma praça. Ela é arborizada, possui uma pista de corrida, aparelhos de ginástica, bancos, brinquedos para crianças. Fica no meio de quatro ruas, e valoriza todo o entorno. É uma praça que está sempre cheia de gente, de vez em quando há feirinhas, aulas de tai-chi-chuan, eventos em feriados e por aí vai.

Acabei de rever dois documentários sobre dois grandes artistas brasileiros: Chico Buarque e Oscar Niemeyer. Filmes que, cada um a seu jeito, me lembraram que a praça que eu gostaria de visitar é bem diferente da que estou acostumado a ver.

No momento em que Chico explicava sobre a encenação musical de "Morte e Vida Severina", no teatro de Nancy, na França, sua voz narra os fatos em cima das imagens dele mesmo passeando pela praça da cidade. Ampla, cercada por prédios baixos e com apenas um monumento ao centro:


Imediatamente me lembrei da Praça São Pedro, na Itália, aquela vastidão de horizonte no meio da cidade, cercada de longe pelos prédios do Vaticano, com um bom espaço para se percorrer andando:


E aí vejo Niemeyer contando como criou seus projetos, de onde vinham as ideias, até chegar à Praça dos Três Poderes, em Brasília. Ele comenta como o projeto foi criticado pelo fato de ser uma praça sem árvores, grande daquele jeito etc. Assim como eu estou acostumado com a pracinha em frente à minha casa, os críticos ainda não estavam acostumados às invenções do arquiteto:



Então ele explicou sobre a necessidade da praça evidenciar a arquitetura em volta, que Niemeyer considera como a arte composta naquele espaço. As árvores trariam sombra, é verdade, mas também esconderiam e limitariam aquela vastidão. E percebi que o princípio também vale para as praças de Nancy e de São Pedro.

Fora a explicação, meu gosto pessoal vai pelo mesmo caminho. Tenho muita vontade de visitar todas essas praças por elas terem preservado algo que a metrópole nos surrupiou faz tempo: o horizonte amplo urbano, puro e simples. O aproveitamento do espaço sem a necessidade de se construir nada nele, apenas a permissão andarilha e contemplativa.

Vivemos tão apertados e tão acostumados à falta de espaço, fruto de visões igualmente estreitas, que essas praças parecem nos lembrar que bom é um simples passeio a pé, sem nada a nos obstruir o caminho.

Isso tem afetado até a moradia: apartamentos minúsculos são vendidos tão somente porque a ganância imobiliária quer colocar o máximo de opções no mesmo andar, saturando o espaço, matando o respiro. Quem vive sem respirar?

Portanto, completo meu roteiro de viagens futuras: Roma (já estava, há séculos), Nancy e, acreditem, Brasília.

Um comentário:

Anônimo disse...

"Na cidade as grandes casas fecham a vista à chave,
Escondem o horizonte, empurram o nosso olhar para longe de todo o céu,
Tornam-nos pequenos porque nos tiram o que os nossos olhos
nos podem dar,
E tornam-nos pobres porque a nossa única riqueza é ver."
Alberto Caeiro (Fernando Pessoa)
Forte abraço mermão!
Pedro