segunda-feira, 8 de março de 2010

Fé e adrenalina

Existe alguma relação entre as duas? Não sei se a ciência, que hoje anda com ares de religião fundamentalista, já se atreveu a dar seus pitacos na questão.

Só sei que, após mais uma boa corrida - daquelas em que a gente se sente melhor depois do esforço feito do que antes - o desejo de exercer a fé por meio da oração veio como bem súbito. Assim como a constatação da perspectiva renovada de crer no impossível aos homens.

Teologicamente posso estar dando asas a uma sutil heresia: se a adrenalina disparada pelo organismo catalisa a fé, então o objeto do que cremos ficaria mais (ou menos) distante a partir de nossa própria biologia. Deus seria menos ou (mais) real de acordo com as reações químicas do corpo humano! Richard Dawkins me daria um beijo na testa depois disso.

Mas minha reflexão não vai por aí, pois não me refiro ao objeto da fé, mas à disposição de exercê-la, de percebê-la viva em nós após uma boa descarga de adrenalina. Inevitável constatar que o hormônio está presente nas marcantes situações da nossa vida. Momentos de emoção, risco, expectativa, ansiedade, nos mais diferentes contextos, são classificados como momentos "de adrenalina."

Imagino o alpinista que, após vencer as alturas e chega ao pico do monte, olha soberano para o mundo abaixo e ao redor, seguro e orgulhoso do feito, e sente-se um pouco à imagem e semelhança de Deus. Assim como o jogador de futebol que dribla o time inteiro e carimba um golaço, sentindo-se, ainda que por um instante, um pouco acima dos mortais colegas de profissão. A fé que alarga os limites e os horizontes, que mostra às testemunhas e aos protagonistas que algo além é possível.

Porém pode ser com coisas mais simples. Me vejo correndo no Aterro do Flamengo por apenas dez minutos num bom ritmo, após uma noite mal dormida e um dia arrastado. E me sinto (verbo arriscado para se usar numa conversa sobre fé...) com maior liberdade de crer - não no sentido sociológico, mas no mais pueril possível. "Apesar dos apesares, creio. Então oro, e renovo a esperança, contra todas as circunstâncias". Volto a querer crer de maneira intensa, e a adrenalina é o resultado laboratorial do exame físico que testou, sem querer, minha fé. E revelou sua ilimitação.

"Ora, a fé é a certeza de coisas que se esperam, a convicção de fatos que não se vêem". A definição bíblica sobre a fé poderia se aplicar, em certa medida, à adrenalina. Ela está em mim, tenho certeza disso após uma bela corrida, convictamente, mesmo sem vê-la. Coerentemente, a experiência é marcante, assim como a possibilidade de crer, sem medo de me extenuar.

3 comentários:

Pedro disse...

Interessante... nunca tinha pensado por aí. É fato q circunstâncias externas influenciam a nossa disposição p/ exercer (ou manifestar) a fé. Todos já ouviram que é na tristeza q nos achegamos mais a Deus. E tb já sentimos, qdo em grande alegria por algo q reconhecemos vir das mãos de Deus, uma gratidão tão avassaladora que quer explodir em louvor. Acho q dá p/ acrescentar a adrenalina na lista.
Muito bom o texto, cara!
Abração

aureliano22 disse...

Vai Rocky Balboa. Sobe as escadarias da fé...
Crente Amplexo

Marcos André Lessa disse...

Rapaz, tenho me sentido muito, mas muito Rocky Balboa da fé... Abs!