quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

Gêmeos não tão siameses


As questões esportiva e administrativa estão misturadas quando o assunto é Copa do Mundo 2014 ou Olimpíadas 2016. O problema é que nem os empolgados nem os críticos separam as duas coisas na hora de cobrir, opinar, torcer ou fazer oposição. E além disso patrulham uns aos outros, acusando-se mutuamente de estarem do lado errado. Minha proposta é fazer uma abordagem separada, sustentando que Copa e Olimpíadas vão ser um grande sucesso esportivo, mas que administrativamente já começamos a pagar um alto preço, em muitos sentidos.


Esportivamente falando

O Brasil é o maior campeão de copas, é a terra do Rei do Futebol e o único país que esteve presente em todas as edições do torneio. Tudo a ver realizar uma Copa aqui, ainda mais no momento econômico em que vivemos. Gerações se passaram até termos a chance de ver a Seleção exorcizando o trauma de 1950.

Quanto às Olimpíadas, pela primeira vez na História nossos atletas vão competir no seu próprio país. Quem acompanhou o desempenho da Grã-Bretanha nos Jogos de Londres sabe como foi emocionante, e como isso fez diferença até pro desempenho.

Não tenho dúvida que os brasileiros serão extremamente receptivos e farão de tudo para acolher delegações e turistas. O número de voluntários pra Copa bateu recordes já na primeira semana. Seremos o centro do mundo por um mês (ou dois, se levarmos em conta a chegada das seleções ao país). Só isso já mexe com nossa autoestima.

Não há outra opção senão apoiar nossa Seleção e nossos atletas olímpicos, a despeito de quem estiver vestindo a camisa. Estaremos em casa, e mesmo os mais indiferentes em acompanhar futebol ou demais esportes vão se inflamar na hora em que começar tudo. Todos nós vamos parar nossas vidas para torcer pelo Brasil. Não vai ajudar nada deixarmos nossos atletas sentindo-se em território inimigo. Se existe uma ocasião em que o ufanismo deve ser encampado, é numa Copa do Mundo e numa Olimpíada dentro de casa.

Toda a organização do evento no âmbito esportivo estará a cargo da FIFA e do Comitê Olímpico Internacional, e não do Brasil. Os árbitros e bandeirinhas serão escalados por ela, a transmissão televisiva seguirá suas coordenadas. O ônus de qualquer decisão sobre o que acontecerá nas competições será da Federação Internacional de Futebol ou do COI.

Ou seja, da nossa parte temos tudo pra fazer da Copa e das Olimpíadas grandes acontecimentos esportivos inesquecíveis – para nós e para o mundo. Hei de torcer, torcer, torcer! Ninguém é (nem deve ser, na minha opinião) contra o Brasil ser o primeiro lugar no esporte. Nesse ponto, será um sucesso.


Administrativamente falando

A questão administrativa corre em paralelo, e se resume em duas perguntas: 1) Que preço estamos pagando por todas essas emoções?; e 2) Esse preço é justo?

Pra galera que critica os críticos, achando que eles são “do contra” ou “azedos”, eu deixo ainda mais perguntas:

- Por que todos os gastos saem dos cofres públicos? Por que não há transparência na composição desses custos? Por que os orçamentos triplicam, quadricuplicam, decuplicam?

- Por que fazer estádios em praças que não têm futebol, gerando os “elefantes brancos” que vão torrar mais dinheiro público na manutenção?

- Por que o legado dos eventos não é levado em conta? Por que melhorias urbanas, principalmente as de infraestrutura e transporte, são minimizadas ou abandonadas?

- Por que toda e qualquer “revitalização” significa “limpar” o perímetro ao redor dos estádios sem levar em conta as características do entorno? Por que os projetos dos eventos não prevêem a integração com a comunidade e a geografia do local?

Todas essas perguntas estão até hoje sem resposta. E não têm relação alguma com o aspecto esportivo dos eventos, trata-se tão somente da prestação de contas e do respeito ao país-sede e à sua população.

As críticas não podem virar um mau-humor crônico que exija a morte do torcedor que há em nós. Por outro lado, torcer não significa ser autista e submisso a tudo o que estiver sendo feito conosco em nome dos eventos. De olho nesse equilíbrio, podemos chegar no ápice das comemorações: pelos títulos e por heranças benditas que Copa e Olimpíadas trouxeram. Imagina...

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