Uma das últimas coisas que eu gostaria de ter na vida seria amnésia. Pensar em perder a memória, seja de coisas recentes ou antigas, me dá arrepios. Sabendo que nossas lembranças estão sempre associadas emocionalmente com episódios importantes da vida, compondo nossa identidade, pior ainda.
Olhamos para determinadas fases de nosso passado e nos assustamos: como pude fazer aquilo? Onde eu estava com a cabeça? E então, alimentados por essa memória que não se apaga de nós, decidimos não errar mais, aquele deslize registrado internamente nos alerta a não repetir o que fizemos de ruim.
Diante disso, há momentos em que eu gostaria de ser argentino.
Nossos hermanos aprenderam que os crimes da ditadura não poderiam ficar impunes, principalmente a tortura. Não é incomum que muitos militares (até de alta patente) tenham sido julgados, condenados e presos quase 30 anos depois de comandar esse tipo de ação.
E a Argentina continua com Forças Armadas! Ou seja, punir quem desonrou os direitos humanos não significa desrespeito ou descaso com os oficiais de hoje.
Mas no Brasil não parece ser assim. Nosso país é especialista em grandes acordos: a anistia foi para perseguidos e perseguidores; em vez de Diretas Já, um pacto para os congressistas escolherem o mandatário da nação indiretamente.
O ministro da Justiça, Tarso Genro, tentou levantar o assunto de punição aos torturadores. O ministro da Defesa, Nelson Jobim, chiou em nome dos militares. Polêmica vai, polêmica vem, o presidente Lula resolveu que não se fala mais nisso.
Ok, Lula definiu que o Poder Executivo não fala mais nisso, deixou a batata quente pro Poder Judiciário. Mas se houvesse vontade política por parte de seu Governo nessa matéria, as coisas não seriam repassadas assim tão facilmente.
E asssim prosseguimos. Tentando deixar o nosso passado embaixo do tapete, como se as memórias pudessem ser simplesmente deletadas. Os torturados e suas famílias não vão esquecer. Os torturadores que ainda existem no aparato policial, por exemplo, sempre vão se lembrar que podem sair impunes.
Nunca antes na história desse país um presidente perdeu tantas oportunidades de fazer História.
Um comentário:
Lessa,
concordo com você. Nunca houve um presidente com tantas possiilidades de fazer história. Com relação específica à questão que levantas tenho aminha opinião de que passado é pra ser lembrado, sempre. Ele é o registro de um tempo. Deve ser continuamente posto em evidencia até como componente do motor de desenvolvimento. A recusa em apontar as verdades sobre o período negro da ditadura se equivale às imposições do silêncio que tanto machucou a criatividade e escondeu as situações trágicas. Na sociedade moderna, com idependência dos sistemas socias, ainda nos sobra, como bem apontas, os tribunais, que nãom podem ser calados pelo Executivo, muito embora haja indícios fortes de que tentativas para isso não faltam. O que mai surpreende é que imagina eu estar votando em uma pessoa com conhecimento de causa e corajosa o suficiente para expor o porão da ditadura. Sem amarguras, quando possível - é claro, mas com o senso de se cumprir um dever de homem cosciente das consequências reais dos anos de chumbo. Agora vai, pensei eu quando eleito o Presidente. Que nada. A Exemplo do FHHHHC, Lula é covarde e se esconde atrás do argumento tolo da prudência para freiar mais essa conquista. Meu avõ foi preso e torturado nos porões da ditadura e como ele muitos sofreram e guardam isso na memória. Mas deixe estar, a fruta está madurando e não há como sustentar tamanha pressão. Essa expectativa terá que ser selecionada.
Abraço,
Henrique
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