domingo, 23 de agosto de 2009

Cortando pela raiz

O caso é chocante de múltiplas formas. Caloura de Direito da Universidade Federal Fluminense (UFF-RJ) acusa veteranos que aplicavam trote de obrigá-la a fazer sexo oral em oito deles, em troca de não pagar os R$ 250,00 de "taxa" para a chopada. Não sei nem por onde começar a me revoltar.

É claro que ninguém merece passar por qualquer tipo de humilhação, jamais. O trote nesse nível é uma excrescência, é um momentinho neonazista em que os veteranos se sentem à vontade pra botar pra fora tudo o que normalmente lhes é proibido pelas regras sociais. A insegurança dos calouros quanto a seu futuro no campus é o facilitador ideal.

Mas é incrível ver alunos de Direito cometendo a atrocidade acima. Eu já me assustava com trotes dos alunos de Medicina - os mais violentos, chegando a resultar na morte de um calouro na piscina da USP, em 1999. Tratam-se simplesmente dos que vão cuidar de nossa saúde e integridade física.

Só que os futuros médicos estudam o corpo, suas patologias, possíveis curas e tratamentos. Não são obrigados, por vocação, a conhecer a lei e suas consequências - o que não justifica seus trotes e desvios de conduta. Não é o caso dos estudantes de Direito, pelo contrário.

Assédio sexual, atentado violento ao pudor, extorsão, chantagem. Quantos artigos do Código Penal englobam esses casos? E quais as penas para cada um deles? Tenho certeza que os veteranos que abusaram da caloura da UFF sabem muito bem. No entanto, por que praticaram tais atos?

A atitude desses veteranos só revela como é possível que o homem da lei sinta-se acima dela muito antes do que poderíamos imaginar. Não estamos falando de ministros do Supremo Tribunal Federal, juízes, desembargadores, altos magistrados (nem estou falando que estes ignoram a lei). São apenas estudantes de Direito, que agiram como se as consequencias de suas respectivas infrações nunca fossem alcançá-los.

Esses alunos futuramente vão advogar, julgar, condenar e absolver os criminosos do país. Se qualquer um dos veteranos futuramente arbitrar sobre casos semelhantes, como será sua conduta? Lembrará que também fez isso na juventude, e que não deve ser levado tão a sério?

Portanto, é dever do Estado e do Poder Judiciário fazer com que esses estudantes experimentem a força da lei. Se assim não for, será um tiro no pé a longo prazo, por contribuir com a construção de uma cultura da impunidade cedo, muito cedo, e logo onde não poderia acontecer: na formação em Direito.

Antes disso, a UFF precisa fazer a sua parte, abrindo investigações sérias para comprovar a denúncia (a aluna não iria inventar uma história dessas). E o objetivo deve ser somente um: expulsar os agressores.

Se a universidade não mostrar vigoroso repúdio pelo caso e disposição para resolvê-lo, ainda poderá passar à sociedade a imagem de conivente. E por ser uma instituição pública, que não depende de doações particulares para se manter, deve se sentir com indepedência plena para isso.

4 comentários:

Cris Crespo disse...

Eh Lessa, assino em baixo. Fiquei tao indignada com essa noticia que nem consegui escrever sobre isso, porque dah muita vontade de xingar esse bando de sei la o que. Fico imaginando se fosse eu nesta situacao ou a minha filha (caso tivesse uma). O que esta acontecendo com a sociedade? Eh um absurdo atras do outro! Tem uma frase que Daniel costuma dizer do Mark Twain e cabe perfeitamente aqui:"Quanto mais conheco as pessoas, mais eu gosto do meu cachorro". Espero, sinceramente, que a UFF tome medidas severas contra esses oito canalhas e que a justica seja, de fato, feita. Nao suporto mais assistir situacoes criminosas impunes. E que a midia de destaque para que esse assunto nao fique esquecido! (a falta de acentos se da pelo fato de estar usando o teclado do meu lap top, ta!?)

Anônimo disse...

Sábias palavras, meu amigo!
Para mim, isto é o reflexo de como o ser humano anda em conivência com a corrupção. De certa forma, são casos semelhantes a estes que justificam a tamanha incompetencia da Justiça no nosso país.
Trote é crime!
Um abraço, Lessa
Will

Daniel Marins disse...

Caro Lessa, certamente, haverá algum tipo de punição administrativa e o caso se manterá, por um bom tempo, sob as luzes da imprensa. No meio jurídico – em que as pessoas, além de sempre se movimentarem e se manifestarem contra qualquer abuso de direito ou ato ilegal, também gostam de uma fofoca –, o caso, te garanto, continuará vivo e será, provavelmente, objeto de reportagem no Jornal da OAB (Tribunal da Advogado).

Além disso, a própria UFF, ao meu ver, dará uma resposta aos alunos, professores, advogados e demais juristas fluminenses – em especial, aqueles que morem em Niterói. Esta espécie de acontecimento, como se diz, é um “queima filma” enorme que acabará jogando “lama” no nome da instituição e na credibilidade da Faculdade.

Comportamentos como os descritos por você, sem dúvida alguma, ensejam a abertura de um processo administrativo disciplinar – com alta probabilidade de expulsão dos alunos; lembremo-nos que não é, apenas, uma infração administrativa, mas a prática (ou tentativa) de crime – frise-se, dentre de um estabelecimento federal!

Tal como você, aguardo o “desenrolar dos fatos”. Vejamos qual será o conteúdo do “capítulo dois” deste tema em seu blog.

Abraços!

Daniel Marins

Marcos André Lessa disse...

Daniel, na medida do possível vou acompanhar o caso. obrigado pela indicação do Jornal da OAB, tentarei acompanhar.