RJTV, acertos e erros (*)
Já faz algum tempo que o RJTV, noticiário local da Globo para o Rio de Janeiro, vem mudando seu formato. Começou como o clássico telejornal, com o apresentador lendo as notícias tendo ao fundo um cenário estático. Depois passou para uma bancada, com links ao vivo e entrevistas no estúdio. Agora conta com linguagem e ambientes informais, além de comentaristas fixos sobre assuntos da cobertura.
O perfil do jornal mudou quando Márcio Gomes e Ana Paula Araújo assumiram a bancada. Além do anúncio das notícias, o telespectador presenciava links ao vivo entre cidadãos apresentando suas queixas e as autoridades responsáveis. Ou com os apresentadores inquirindo os governantes (dentro dos limites do oligopólio midiático brasileiro), sem edição. A prática, ainda que em menor escala, ainda acontece hoje, às vezes com a autoridade no próprio estúdio.
Foi nessa época também que o RJTV diversificou sua audiência: na tela da Globo, lugares além da Zona Sul (e até da Baixada Fluminense) começaram a ter seus problemas relatados. O jornal desenvolvia uma importante característica que ainda não abandonou: prestar serviço público por meio das denúncias da falta de serviços públicos.
Tal prática mostra-se útil tanto para os cidadãos como para os repórteres, que em sua ampla maioria são oriundos da classe média. Isto é, provavelmente nunca pisaram em lugares como Queimados ou Austin, tampouco tiveram contato com pessoas que vivem à margem do espectro de consumo que define nossa cidadania atual. A sensibilidade do jornalista é, no mínimo, estimulada para além do seu mundo.
Qual o valor informativo?
A prática que sintetiza o maior mérito do RJTV, desde sua mudança de perfil, é quando a reportagem está no local da denúncia, relatando o problema lado a lado com os moradores e a autoridade. Esta, por sua vez, é instada a dizer, ao vivo, qual o prazo para resolver o problema. O repórter marca a data futura num calendário (que também fica com os moradores) e se compromete a voltar ao local para ver se a promessa foi cumprida. E volta.Num tempo em que o jornalismo declaratório e de "encher prateleiras" de notícias não acompanha o desenrolar das denúncias, a prática acima citada do RJTV merece ser elogiada.
O formato atual, mais informal, é fruto de uma perda de audiência para outra atração de mesmo horário, o popularesco programa de Wagner Montes. O jeito "mais à vontade" de apresentadores e entrevistados, dispensando até mesmo a bancada, aproxima o jornal dos telespectadores.
Mas é aí também que reside o risco do sensacionalismo, no qual o RJTV vem caindo ultimamente. Quando um acidente entre um carro e uma moto na Avenida Brasil matou algumas pessoas, no dia seguinte (!!!) estavam no estúdio os pais das respectivas vítimas. Não faltou sequer a pergunta terrível, porém previsível: "Como o senhor está se sentindo?" Em seguida às óbvias lamentações, o choro compulsivo ao vivo, Ana Paula Araújo põe a mão no braço do entrevistado, diz "Nós entendemos" e passa ao pai da segunda vítima, para que este também dê seu depoimento. Qual o valor informativo disso? Já o de captar audiência...
Sensacionalismo é mais fácil e tentador
O mesmo vale para o cruel episódio da menina Lavínia, aparentemente assassinada pela amante de seu pai em Duque de Caxias. Como era de se esperar, nos tabloides está a imensa foto com o rosto da suspeita (embora, como sempre, tratada como culpada e condenada), com os usuais tratamentos de "monstro" e "fera" da Baixada e os detalhes das horas finais da criança.
Porém, o RJTV de 03/03/2011, em toda a sua potência audiovisual, reproduziu a mesma lógica. O único assunto da edição, praticamente, foi a morte de Lavínia. As imagens da acusada chegando à delegacia e aguardando para depor eram repetidas, até em câmera lenta, para ilustrar os comentários de Rodrigo Pimentel. O velório de Lavínia foi acompanhado pela reportagem. A diretora da escola onde a menina estudava, assim como a professora da turma, foram entrevistadas. Uma vez mais: qual o valor informativo?
Os editores do RJTV deveriam fazer o exercício a que este Observatório está acostumado: analisar seu trabalho e pensar se o caminho é mesmo esse. O RJTV é o noticiário com mais chances de fazer um bom jornalismo continuado, com olhares diversificados, mesmo dentro das Organizações Globo. Sua história recente comprova isso, inclusive com garantia de audiência. Faz jornalismo popular respeitando os populares.
O sensacionalismo sempre será um caminho mais fácil e tentador. Mas nunca vai contribuir para a prestação de serviço público ou para a construção da cidadania. É uma questão de escolha para Ana Paula Araújo e companhia.
(*) Texto originalmente publicado no Observatório da Imprensa
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