segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

Na pista

Segunda aula. Seu Roberto me deu a chave e fomos em direção ao carro. Enquanto eu abria a porta ainda de pé, do outro lado o instrutor estava na mesma posição, aguardando o início de mais uma aula em seus 41 anos de carreira. "E então, seu Roberto, esse carro roda hoje?", perguntou o ansioso naif. "Tenho toda uma programação. Eu não tenho pressa de nada", foi o que ele disse. E entramos no carro.

Nesse momento eu joguei a toalha da esperança. Coloquei as mãos no volante e prestava atenção em mais uma explanação de seu Roberto sobre o trânsito, sobre a prova e os avaliadores... Olhava a rua Haddock Lobo com tudo que é automóvel (menos o que eu estava) e percebia que os pedestres já tinham andado bem mais do que eu motorizado.

- Agora você liga o carro e dá a seta. Vamos sair.

Hein?

(Eu não disse literalmente "Hein?". Foi uma interjeição interior, o meu ser pego de surpresa, numa reviravolta digna dos melhores roteiristas de cinema ou TV. Com tudo certo para mais uma aula estática, vi que eu deveria entrar naquele intenso trânsito do rush da manhã. Não digo que deu medo, apenas um pequeno pânico - popularmente conhecido como "cagaço" - ao ver que o que eu tanto desejava iria acontecer. E não adiantava pedir pra roda gigante parar e descer.)

A primeira impressão é que são 327 mil coisas nas quais se deve prestar atenção enquanto dirigimos, e dava graças a Deus por ser teleguiado pelo instrutor. Eu, que nunca quis servir, adorava receber a "voz de comando" de seu Roberto. Era a garantia de não avariar o carro ou minha saúde. Não exagero. Era a primeira vez na vida em que eu colocava um carro em movimento sem estar empurrando!

Dirigir parecia impossível. Não entendia como tantas pessoas conseguiam. Depois vi que estava sendo exigente demais para uma primeira aula prática, confesso. Porém meu diálogo com a embreagem ainda não é dos melhores.

****

As aulas se seguiam e percebi que outro defeito a ser corrigido é uma tensão concentrada no volante. Braços duros que nas curvas quase me levam a um giro de 360 graus pelo simples fato de não deixar o volante voltar. Um dia seguimos para o Sumaré. Seu Roberto: "Agora eu quero ver como vai ser, até lá em cima são umas 250 curvas". Desafiador.

Em boa parte do tempo a estrada para o Sumaré é cercada de mata, mas à medida que fica mais alto, a cidade surge lá embaixo. A cada curva (malfeita), o medo de altura resolvia deixar tudo mais emocionante. Quase arregalei os olhos quando seu Roberto orientou: "Vira ali à esquerda, no heliponto".

****

Aula de baliza. Seu Roberto me ensina todos os pontos de referência para estacionar. De fato, fica bem mais fácil e não tive dificuldades das primeiras vezes. Mas se você esquece um daqueles pontos no meio do processo, vem aquela cara de idiota com a legenda: "O que estou fazendo aqui?".

Se beliscar a faixa, fim de prova (ou "fim de linha", como seu Roberto gosta de dizer). Se encostar na baliza, também. Se deixar o carro morrer (não só na baliza), idem. Eu não sei se tenho que tirar carteira de motorista ou virar astronauta.

Temos 4 minutos para estacionar e depois mais 4 pra sair da vaga, mas sei lá por que eu sentia que estava jogando basquete faltando 10 segundos pra tentar a cesta redentora. Resultado: nervosismo, desmemoriamento, cara de idiota.

****

Fim da última aula - foram 20 no total. O volante já não é castigado pela firmeza nervosa das minhas mãos, a não ser quando um pedestre suicida aparece no caminho, bagunçando minha cognição. A embreagem continua na voltagem 8 ou 80: é deixar o pé lá embaixo ou largar de uma vez, dando alguns trancos desnecessários e certamente fatais na hora da prova. Baliza ok, mas vou decorar os pontos de referência como fazia com as fórmulas de Química e Física na escola.

Enquanto isso, aguardo a marcação da prova e, na minha cabeça, imagino cada deslocamento que hoje faço via transporte público, só que ao volante do nosso carro. Coitado, ainda vai sofrer muito na minha mão.


Veja como foi a primeira aula.

2 comentários:

Anônimo disse...

Que coincidência! Hoje vi um carro da autoescola Lessa! Beijo, Quênia.

Anônimo disse...

É, todo mundo me perguntava se eu era parente do dono dessa autoescola... rs

Lessa