Pequenas anotações educacionais
Solidarizei-me com o Ministro da Educação Cristovam Buarque ao ler sua entrevista a Míriam Leitão no GLOBO de hoje (26/04). Como todos sabem, o ministro é, por vocação, obcecado pela educação. É dele a idéia metafórica da “segunda abolição” em relação à desigualdade social. Cristovam relembra o contexto da abolição da escravatura, que se deu devido a vários procedimentos históricos, mas algo foi principal: já não era viável para ninguém que a escravidão continuasse. E isso no sentido mais literal da coisa: não era viável social nem economicamente, de modo que a situação chegou a um nível em que não havia outra solução senão libertar os escravos.
Paralelamente, o ministro afirma que a desigualdade social está chegando em níveis parecidos. A escalada da violência, a miséria cada vez mais impossível de se ignorar, o “apartheid” entre os que têm e os que não têm, tudo isso somado à “sensibilidade” da sociedade de consumo, que começa a perceber o quão caro está ficando manter essa desigualdade, gastando rios de dinheiro com a indústria da segurança, por exemplo.
Com esse embasamento, o ministro está lutando para que a educação seja uma prioridade no governo atual. E ninguém em sã consciência pode negar que a erradicação do analfabetismo e um ensino/aprendizado de qualidade no mínimo faz com que os cidadãos se vejam como tal, esclarecendo-se e em maiores condições de diminuir o abismo da desigualdade.
Mas minha solidariedade com o ministro foi quando ele respondia à crítica feita pelo economista José Márcio Camargo ao programa de alfabetização de adultos, dizendo que é preciso concentrar-se nos jovens. Do contrário, em alguns anos haverá 40% de brasileiros (crianças de hoje) que não terão completado o 1º grau. Ao que o ministro respondeu:
“Respeito o economista e acho que está em boa companhia. Meu mestre, Darcy Ribeiro, pensava assim também. Mas eu não quero fazer essa escolha de Sofia. É como chegar em casa e ver sua mãe e seu filho doentes e levar apenas o filho ao médico: quero salvar avó e neto. Sei que, do ponto de vista econômico, este raciocínio de esquecer os velhos faz sentido. Mas não acho que ele faça sentido do ponto de vista ético.”
Aí está o terrível dilema do ministro. Sua última frase é emblemática, em um mundo no qual sabemos mais o que é risco-Brasil e superávit primário do que Fundef (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério). O lucro sempre existiu, mas a que ponto se chegou? Faz sentido esquecer os velhos na sociedade de consumo voltada quase que exclusivamente para pessoas de 12 a 30 anos (no caso, eu)? Pior é que faz. Como para muitos faz sentido diminuir o valor da educação, como se esta não fosse em boa parte responsável pela dignidade humana – muito mais do que os cifrões.
Ouço com certo alívio o compartilhar de Cristovam Buarque de não se render ao monetarismo que transforma a ética em mais um item de prateleira. E aí eu dou uma “panfletada” meio sem querer, já que não é este o objetivo do blog. Para os que duvidavam que a esperança venceu o medo, eis um lampejo de que isso ainda é verdade. Pelo menos no Ministério da Educação.
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