sexta-feira, 10 de abril de 2009

Em cima do muro

O Secretário de Ordem Pública, Rodrigo Maria Zilda Bethlem, defendeu em artigo no Globo a construção de muros em volta de comunidades pobres a fim de reduzir a favelização e a consequente devastação ambiental do Rio de Janeiro. Até aí, nada de novo: nem na solução, nem na motivação excludente da proposta.

Curioso foi o argumento utilizado por Bethlem para defender a ideia (ou minimizar o buburinho?): acusa os críticos de hipocrisia, pois não consideram os muros de um condomínio de classe média como segregação, e sim proteção. Por que não veem os muros em volta das favelas da mesma forma?

Se alguém não vê os muros de condomínios como segregação é porque tem uma mentalidade muito estreita. Pergunte a um jovem de 18 anos, nascido e criado em condomínio, se ele conhece a cidade do Rio. Se sabe como se deslocar pra encontrar outros cidadãos de mesma naturalidade que ele. O condomínio, uma mini-cidade quase autônoma, não se integra com o resto da metrópole.

A grande diferença que Bethlem não vê (ou ignora) é que a decisão dos condomínios terem muros é tomada... pelos moradores! Que nunca tiveram problemas de serem donos de suas moradias, ou de pagar por elas e por seus respectivos terrenos. Vai igualar essa situação a dos favelados?

E outra: se o objetivo do muro em volta das comunidades é impedir a devastação ambiental, por que não se faz o mesmo na outra ponta? Todo mundo sabe que os novos condomínios da Barra da Tijuca, Recreio e Jacarepaguá estão destruindo áreas de preservação (já garantidas por lei!), e que todo o terreno é movediço. A Vila do Pan está afundando desde a época dos jogos!

Não quero tratar de maneira simplista o problema da moradia ou das favelas cariocas. Mas Rodrigo Betlhem e seu chefinho Duda Paes querem. E o fazem para atender a uma expectativa de boa parte da classe média e da especulação imobiliária. E porque não tem competência ou vontade política para pensar em algo diferente.

O artigo de Bethlem foi publicado na véspera da Páscoa. Prefiro acreditar no coelhinho do que nas boas intenções do ordeiro público.

6 comentários:

Paulo Cassiano disse...

Nobre amigo,

Eu já imaginava esse tipo de "proposta" vindo do tipo de Governo que temos nesta cidade...

Não sei se me entristeço ou se destilo minha raiva por isso...

Eu sempre achei que o verdadeiro problema das favelas é político, então faço o que posso fazer: não voto em quem age como eles agem para com essa gente...

Esse problema (favelas) não se resolve "da noite para o dia", mas espero um dia ver alguma proposta decente neste sentido...

marcelo disse...

como você bem disse, em condomínio a decisão pelo muro é dos moradores, para proteger o que está dentro - a si mesmos e, em última análise, o patrimônio. nos morros, os muros protegerão o que está fora - as pessoas "de bem" e as matas. à revelia dos habitantes.

lembro-me também da comparação entre as favelas e os guetos sulafricanos feita pelo delegado e ex-chefe da polícia civil, hélio luz, em "notícias de uma guerra particular". ele diz que aqui, ao contrário de lá, a coisa é tão sutil que nem precisa de grades para conter os favelados. parece que as coisas vão mudar...

Henrique Blecher disse...

Meu amigo...Va la no meu blog e veras um pouco do que fez essa corja de politiqueiros filhos da puta (como diz o poeta Ciro Gomes) ser eleita.
Roda mundo roda gigante roda mundo roda peao...

Marcos André Lessa disse...

Paulo, estou como vc. Não votei na turma do Paes (e não da paz) e fiz de tudo para que ninguém votasse também.

Burger, o "Notícias de uma guerra particular parece ser o resumo da vida carioca, não?

Henrique, comecei a ler o artigo, mas ainda não terminei. Prometo que completo a leitura!

Paulo Cassiano disse...

Eu tenho esse DVD ("Notícias de uma guerra particular" e INFELIZMENTE esse é sim o "resumo da vida carioca"...

Passados mais de dez anos de sua produção, ela ainda é bem atual... Misericórdia...

Adriano disse...

Paulo, e provavelmente continuará atual por muitos e muitos anos...